terça-feira, 9 de fevereiro de 2010

     É engraçado como desenvolvemos uma espécie de "amizade" unilateral com artistas que a gente admira (eu tenho uma pequena galeria de “amigos imaginários que existem”). Não vou ficar citando nomes, mas acontece que ontem descobri que um deles tem uma forma rara e agressiva de alzheimer. É claro que quando falo “amigo” sei perfeitamente a diferença entre uma coisa e outra, mas, de alguma forma, os livros desse cara viraram meus amigos e fiquei realmente triste com a notícia.
     O mais triste, talvez, é um sujeito tão inteligente quanto aquele ter justamente uma doença que destrói sua capacidade de pensar. Confesso que, egoisticamente, pensei num monte de escritores para os quais um cérebro não faria a menor falta. Pense num cara que, literalmente, inventou um mundo fantástico, recheado de humor da melhor qualidade; que tem mais de vinte livros publicados; que sabe usar as palavras com tamanha sutileza que é comum você perder alguma piada ou referência no menor descuido. Pense num cara que tinha uma “meta” de páginas por dia. Diz o Neil Gaiman que Prachett, certa vez, ao terminar um livro e faltar ainda vinte páginas da sua produção diária, simplesmente começou outro. Há uns dez anos seus livros têm sido uma ótima companhia em casa, no trânsito e nas conversas de boteco. Ainda hoje é comum, quando não sei que livro vou levar para a rua, que eu cate, instintivamente, o pocket surrado de Good Omens e coloque no bolso.
     Agora, esse cara está usando sua perspicácia (que sabe estar com os dias contados) para defender, na Inglaterra, o direito ao suicídio assistido. Não vou entrar na discussão (boba) sobre os direitos que cada um pensa ter ou tem sobre a própria vida. Isso é crença e na fé dos outros eu não meto a mão. Mas acho muito triste pensar na mente de Terry Pratchett sendo comida aos poucos por uma bosta de uma doença sem que ele possa, pelo menos, abreviar isso.

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